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As Agências Reguladoras chegam ao final de 2021 diante de um quadro que ameaça todos os avanços esperados com a nova Lei do Gás. Os recentes embates judiciais em torno dos reajustes de preços da molécula de gás contrariam a expectativa inicial de proporcionar ao País a abertura do mercado com uma fonte energética acessível e preços mundialmente competitivos. A esperança de um novo ano melhor é a chama que mantém firme a energia dos entes reguladores na busca por garantir a excelência dos serviços de gás natural canalizado atrelada à modicidade tarifária.
Quando da tramitação do Projeto de Lei do Gás no Congresso Nacional, a ABAR enviou cartas aos parlamentares, com o intuito de chamar a atenção do Poder Legislativo e da sociedade em geral, alertando claramente para o risco que a proposta representava à segurança e ao abastecimento local. Lamentavelmente, os perigos mencionados à época mostram-se, hoje, uma realidade.
Um dos principais alertas feitos pela ABAR refere-se aos riscos associados à manutenção do monopólio da Petrobras, dado que diversas “condições precedentes” que deveriam ter sido solucionadas desde a edição Lei do Petróleo, em 1997, até o presente não o foram. Todavia, o que parecia ser uma simples ameaça agora tem se mostrado real, já que a Petrobras, em claro exercício do poder de monopólio, procura aumentar substancialmente os preços da molécula de gás.
Conforme alertado pelo Tribunal de Contas da União[1] em recente relatório sobre o tema do cumprimento do TCC Cade – Petrobras, o governo federal não editou os necessários regulamentos para garantir acesso às infraestruturas essenciais, que são de propriedade da Petrobras. Assim, sem acesso a essas infraestruturas, os produtores de gás não conseguem vender seus produtos na costa – ou vendem para a Petrobras, ou o gás fica preso no fundo do Pré Sal.
Enquanto isso, o Brasil está reinjetando no Pré Sal aproximadamente 60 MM m³/dia (sessenta milhões de metros cúbicos por dia) de gás natural. Ou seja, quase duas vezes o consumo diário somado de todas as indústrias, comércios e residências do País. Conforme destacado no alerta feito pela ABAR, não foram realizados os investimentos necessários para o escoamento desse gás, por falta de uma política nacional de gás capaz de colocar o Brasil na posição de grande produtor mundial de gás natural, ao invés de depender do abastecimento de GNL para garantir a segurança energética nacional.
A consequência drástica dessa dependência é o risco de desabastecimento. As Agências Reguladoras constatam a permanência do monopólio de fato exercido pela Petrobras, com alto custo de molécula indexada ao JKM (índice asiático de cotação dos preços de GNL). Há fundamento para tal indexação? Não. O Brasil, grande produtor de gás, está altamente dependente de preços do mercado asiático.
Em virtude do término da vigência de contratos de suprimento, previsto para 31 de dezembro de 2021, os players de gás canalizado buscaram, nos últimos meses, as melhores propostas no mercado para a compra de gás natural. No entanto, as únicas ofertas que permaneceram ao final do processo para a modalidade firme foram as da Petrobras.
Além disso, em alguns casos, a Petrobras participou de certames públicos, apresentando propostas de contratação. No entanto, ao tomar ciência de que não havia concorrentes, retirou suas propostas, para depois apresentar preços em patamares muito mais elevados.
A dificuldade de obtenção de propostas suficientes ao abastecimento do mercado consumidor de gás natural, conjugada com a prática de abuso de posição dominante da monopolista – que impõe valor de molécula de gás substancialmente elevado – dificulta sobremaneira o alcance dos benefícios esperados com a nova Lei do Gás.
Vale mencionar que a modicidade tarifária é um princípio consagrado no art. 6º, § 1º da Lei nº 8.987, de 1995, como pressuposto de serviço adequado – ou seja, para que o serviço público seja considerado adequado é necessário que a tarifa cobrada seja módica, garantindo o serviço acessível a todos os usuários.
Quanto ao argumento de que o mercado livre de gás deve se dar no âmbito do transporte, alertamos para o risco de concentração de poder econômico nos agentes transportadores e, por consequência, risco de aumento de preços aos usuários finais.
Por fim, a ABAR reforça seu compromisso de realizar todos os esforços necessários para promover um mercado de gás com mais dinamismo, concorrência, transparência e harmonia.
FERNANDO FRANCO
Presidente da ABAR
Brasília, 29 de dezembro de 2021